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Déficit de armazenagem no Paraná põe produção de grãos em risco
Safras avançam além da capacidade de estocagem, tirando dos produtores as rédeas da comercialização. Déficit estadual chega a 12,6 milhões de toneladas
Publicado em 22/07/2025 09:01
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O Paraná está prestes a assistir ao agravamento de uma realidade que já é alarmante para a estocagem da safra. O Estado tem, hoje, um déficit de armazenagem de 12,6 milhões de toneladas. O volume de grãos produzidos vem crescendo além da capacidade de silos e armazéns, o que intensifica o alerta para as próximas temporadas. Outro fator negativo é que produtores terão dificuldade de investir em estruturas: o recém-lançado Plano Safra 2025/26 trouxe juros que praticamente inviabilizam os financiamentos.

Nos últimos dez anos, a produção de grãos do Paraná teve um salto de 19,5%, chegando a 44,9 milhões de toneladas na temporada passada, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Para a safra 2025/26, a previsão é de que o Estado supere essa marca, chegando a 45,2 milhões de toneladas, respondendo por 14% na produção nacional de grãos.

No mesmo período, a capacidade de armazenagem cresceu, mas a um índice inferior: 12,8%. Segundo o Sistema de No mesmo período, a capacidade de armazenagem cresceu, mas a um índice inferior: 12,8%. Segundo o Sistema de Cadastro Nacional de Unidades Armazenadoras (Sicarm), a capacidade de estocagem do Paraná é de 32,6 milhões de toneladas, somando as 1.594 unidades armazenadoras e 2.513 silos cadastrados.

Hoje, apenas 4,7% da capacidade de armazenagem do Paraná estão em propriedades rurais. Para efeitos de comparação, nos Estados Unidos, mais de 53% da capacidade de estocagem de grãos dizem respeito a silos e armazéns que ficam nas fazendas. Isso corresponde a estruturas que suportam, no total, entre 343 milhões e 367 milhões de toneladas.

“Esse cenário reforça um alerta. Nós batemos recordes de produção safra após safra, mas as estruturas de armazenagem não estão acompanhando esse movimento. Não porque os produtores e cooperativas não queiram investir, mas porque os programas voltados à armazenagem não têm sido atrativos. Precisamos que o governo federal priorize essa
questão”, diz o presidente interino do Sistema FAEP, Ágide Eduardo Meneguette.

Área preterida

Os dados demonstram que o tema não tem sido tratado como prioridade pelo governo federal. O recém-lançado Plano Safra 2025/26 previu R$ 4,5 bilhões para o Programa de Construção e Ampliação de Armazéns (PCA) acima de 6 mil toneladas, com juros de 10% ao ano. Entidades paranaenses, incluindo o Sistema FAEP, reivindicavam R$ 8 bilhões de recursos para esta linha de financiamento, com juros de 8% ao ano.

Para o PCA até 6 mil toneladas – voltado à construção de estruturas menores –, o Plano Safra 2025/26 previu R$ 3,7 bilhões, a uma taxa de 8,5% ao ano. O volume financeiro é equiparado ao solicitado pelas entidades paranaenses, mas os juros são mais altos. O setor agropecuário pedia que a taxa de juros ficasse em 7% ao ano: 1,5 ponto porcentual abaixo do estabelecido pelo governo. No final de 2022, a Confederação da Agricultura e da Pecuária do Brasil (CNA) fez uma pesquisa com 1.065 produtores rurais de todas as regiões. Na ocasião, 72,5% disseram que investiriam em armazenagem se a taxa de juros fosse atrativa.

“Além do volume financeiro ser insuficiente, os altos juros estabelecidos no Plano Safra desestimulam a adesão. Nós estamos falando sobre algo entre 1,5 e 2 pontos porcentuais ao
ano, significativo em um cenário em que o produtor já precisa recorrer ao crédito rural em outras etapas do processo produtivo”, aponta Luiz Eliezer Ferreira, técnico do Departamento Técnico e Econômico (DTE) do Sistema FAEP.

Somadas, as duas linhas do PCA disponibilizarão R$ 8,2 bilhões. O montante é quase a metade do necessário, segundo a Associação Brasileira de Máquinas, que pedia R$ 15 bilhões.

Estrutura estratégica

Ter uma estrutura de armazenagem adequada é imprescindível, do ponto de vista estratégico. Com capacidade estática de estocagem, os produtores podem não só melhorar a qualidade do produto destinado à exportação, como também esperar o momento mais adequado para a venda dos grãos. Em síntese, o fato de ter unidades de estocagem suficientes pode garantir uma renda melhor ao setor agropecuário.

“Se o produtor não tem uma estrutura de armazenagem à disposição, ele não consegue segurar a produção para vender em um momento de alta”, aponta Ferreira.

“É uma libertação”, diz produtor que investiu em silos

Em Goioerê, no Noroeste do Paraná, o Grupo Agrícola Fortis cultiva grãos, alternando soja e milho, em 2,3 mil hectares. Toda a produção era comercializada em operações com cooperativas da região. Um dos responsáveis pela gestão do empreendimento, o produtor rural Sérgio Fortis, sempre viu a armazenagem como uma questão estratégica. Insatisfeito com os descontos impostos pelas cooperativas – em consenso com o pai, Pedro, e com o irmão, Roberto –, ele decidiu investir na construção de silos na propriedade.

Com capacidade para 14 mil toneladas, o armazém entrou em operação no início de 2021. Deu tão certo que em dois anos a estrutura chegou ao limite, o que levou Fortis a ampliar o complexo. O armazém passou, então, a ter estrutura para estocar até 24 mil toneladas de grãos.

“É muito viável. O produtor, é claro, precisa fazer as contas e dimensionar a sua realidade. Mas no meu caso, o investimento está se pagando com folga”, diz Fortis, que por nove anos, foi presidente do Sindicato Rural de Goioerê e hoje integra a diretoria. “Produtores menores, que cultivam em 500 hectares, investiram e também estão satisfeitos”, acrescenta Fortis.

Ele aponta que as cooperativas seguem um padrão de negociação. Os agricultores entregam a produção, que é classificada e armazenada. Segundo o Fortis, se o produto não for comercializado em um ano, as cooperativas passam a cobrar uma taxa.

“Você entrega [o produto] e só no fim sabe quanto vai receber. A cooperativa não fala: ‘Estamos cobrando X pela secagem e Y pela armazenagem’. Simplesmente vem o desconto e acabou”, relata Fortis. “Agora, eu consigo vender o milho até 25% acima do que receberia no balcão da cooperativa. Dá em torno de 8% a mais”, exemplifica.

Fortis menciona que passou a ter o controle total da operação, avaliando o melhor momento para comercializar a produção. Além disso, ele controla a qualidade do produto entregue. Ele menciona o caso do milho, cuja tolerância de ardidos para lotes comerciais é de 6%. Chuvas em excesso na época da colheita, por exemplo, podem implicar no aumento do índice de ardidos. Mas, ao dispor de um complexo de armazenagem, o produtor pode controlar a qualidade do lote.

“Se o produtor entregar um lote com 15% de ardidos à cooperativa, ele tem um desconto feroz. Mas tendo os silos, eu posso pegar um outro lote que tenha baixo índice de ardidos e fazer uma mistura, deixando dentro da margem. Ele fica dentro do tolerável e zera o desconto”, explica. “Além disso, eu tenho o produto na mão. Eu entrego para quem pagar melhor, no momento mais favorável. É uma libertação”, detalha.

Burocracia assusta

No caso de Fortis, a burocracia quase atravancou o empreendimento. Ele fez o projeto e deu entrada com o pedido de financiamento pelo PCA. O processo, no entanto, custava a tramitar, a ponto de o produtor quase desistir da empreitada.

“Foi tanta burocracia, que só conseguimos fazer porque uma cooperativa de crédito local bancou e nos fez as mesmas condições do PCA”, diz.

Fonte:

 FAEP

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